No programa Última Análise desta quarta-feira (04), o centro do debate foi o voto divergente do ministro André Mendonça, no julgamento da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil da Internet pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O dispositivo, alvo dos outros colegas da Corte, determina que provedores de internet só podem ser responsabilizados civilmente por danos gerados por terceiros após ordem judicial e caso não tomem providências para indisponibilizar o conteúdo. Mendonça defendeu o trecho da lei, em um voto considerado como uma “aula de liberdade de expressão” para o comentarista Deltan Dallagnol.
Em um dos argumentos mais fortes a favor do artigo, Mendonça comparou a possibilidade de censura às redes sociais à censura de livros. Isso porque, em caso de inconstitucionalidade do artigo, abriria espaço para ainda mais bloqueios de conteúdo por parte do STF, sem necessidade de autorização judicial. “Será que as pessoas que concordam em retirar conteúdo sem decisão judicial também concordariam em arrancar a página de um livro, também sem decisão?”, questiona Deltan.
“É importante alguém divergir”, reforça o comentarista Francisco Escorsim. Segundo ele, mais importante do que o conteúdo da decisão é essa “quebra da unanimidade” que o voto de André Mendonça trouxe. “Só o fato de ser divergente coloca a dificuldade para que as plataformas censurem de modo automático”, ele afirma.
Defesa da Constituição ou jogada política?
Por trás do julgamento está novamente a vontade do STF em regular as redes sociais. O ministro Dias Toffoli fala, em seu voto, da omissão do Congresso Nacional na questão. Mas Dallagnol demonstra uma visão contrária. “O Congresso não está omisso. Ele fez uma legislação e ela se chama Marco Civil da Internet”, diz. Ainda, ele lembra que o Legislativo recusou o projeto das “Fake News”, que também buscava regulamentar as redes, após pressão popular.
O comentarista Daniel Vargas avalia que estamos em um momento de “inversão do jogo”. Ele explica que o julgamento pode decidir se a ampla participação da sociedade no debate público pode ser substituída por uma perigosa lógica de controle estatal.
Além disso, afirma que há uma vontade de estreitamento do Judiciário com o Executivo: “Este caso pode ser uma maneira, também, de compartilhar as afinidades e celebrar a união entre os dois poderes em nome de uma causa”, ele afirma, em referência à regulação das plataformas.
O impacto nas eleições de 2026
Escorsim destaca a rapidez da retomada do julgamento, que havia sido suspenso por um pedido de vista de Mendonça, em dezembro de 2023. “O STF corre contra o relógio, porque tem que condenar (Jair) Bolsonaro e tem que fazer as movimentações para as eleições do ano que vem. Muito do que move os ministros é o medo deste resultado eleitoral”, afirma.
Deltan aponta dois problemas graves que podem decorrer do julgamento em questão. O primeiro seria em relação à censura: “Se a plataforma começar a tirar conteúdo, vai começar a estabelecer, por exemplo, palavras indevidas”. Já o segundo se relaciona ao excesso de poder estatal: “Não se iludam: o governo vai criar um órgão para fiscalizar. Ainda que seja do próprio Executivo, e sem previsão legal”, alerta.
O programa Última Análise faz parte do conteúdo jornalístico ao vivo da Gazeta do Povo, no YouTube. O horário de exibição é das 19h às 20h30, de segunda a quinta-feira. A proposta é discutir de forma racional, aprofundada e respeitosa alguns dos temas desafiadores para os rumos do país.