O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) participou nesta terça-feira (17) da abertura da Cúpula do G7, grupo que reúne os sete países mais ricos e industrializados – Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, França, Alemanha, Itália e Japão. Apesar do convite, feito pelo anfitrião da cúpula do G7 deste ano, o primeiro-ministro Mark Carney, do Canadá, Lula minimizou a influência do grupo nos debates sobre a geopolítica atual. Além disso, o presidente brasileiro endossou o discurso feito pelo ditador russo Vladimir Putin de que o grupo atual era “inútil”.
O Brasil participou do evento como convidado para discussões ampliadas e, durante seu discurso, o petista destacou que atualmente o grupo deixa um “vácuo de liderança” e defendeu maior protagonismo para o G20.
O país comandado por Putin foi expulso do antigo G8, atual G7, em 2014 como resposta à anexação da Crimeia ao território russo. A expulsão marcou um ponto de inflexão nas relações da Rússia com o Ocidente, levando a uma série de sanções econômicas contra Moscou e ao aumento das tensões geopolíticas, que se intensificaram ainda mais com a invasão da Ucrânia em fevereiro de 2022.
“Putin participava do G8. Acho que o G7, no fundo, no fundo, não há nem necessidade de existir o G7. O G20 é mais representante. O G20 eu acho que tem mais importância, tem mais densidade humana, tem mais densidade econômica”, disse Lula ao desembarcar no Canadá.
O presidente brasileiro ainda ironizou o convite, alegando que participa como convidado desde 2003 do evento. “[O G7] existe desde 1975, desde a crise do petróleo. São os primos ricos que se reúnem. Eles não querem parar de se reunir, mas eles estão no G20. Eu participo para não dizer que eu recuso a festa dos ricos”, completou Lula.
A fala de Lula está alinhada ao discurso de Putin, que respondeu nesta semana o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O norte-americano afirmou que o G8 errou ao expulsar os russos em 2014. “Foi um grande erro”, afirmou Trump, acrescentando que acreditava que a Rússia não teria invadido a Ucrânia em 2022 se o presidente Vladimir Putin não tivesse sido expulso do clube de líderes.
Na sequência, o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, disse aos repórteres: “Concordamos com o presidente Trump: foi um grande erro excluir a Rússia do formato do G8”. Ele afirmou ainda que o grupo havia “perdido a importância prática” para a Rússia, dada a situação dos assuntos mundiais.
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Pauta de Lula no G7 perde espaço para o conflito no Oriente Médio
O discurso de Lula pelo fim do G7 e em defesa do G20, grupo que reúne 19 países mais a União Africana e a União Europeia, acontece em meio ao esvaziamento do protagonismo do petista na agenda internacional. O objetivo da diplomacia brasileira era de que Lula usasse a viagem para chamar atenção para a Conferência do Clima (COP-30), que será realizada no Brasil em novembro. Apesar disso, os recentes conflitos no Oriente Médio dominaram os debates na cúpula dos sete países mais ricos.
Para Marcelo Suano, cientista político e analista de relações internacionais, o posicionamento do governo brasileiro de priorização da G20 mostra que Lula “está cada vez mais a reboque dos interesses da China”. “A sugestão de que o G7 deveria deixar de existir e ser substituído pelo G20, vinda do presidente Lula, representa um posicionamento estratégico alinhado com a China e com blocos que contestam a ordem internacional atual”, argumenta Suano.
“O que ele está dizendo é: no G20, podemos incluir a todos e trabalhar em blocos contra os países industrializados. Isso praticamente respalda o posicionamento chinês de que é preciso um redirecionamento da governança global, dando mais força a países que, muitas vezes, ficariam a reboque da China, aumentando seu peso específico”, completou o analista.
“A ideia é que o G20 se torne o principal espaço de cooperação econômica por ser um fórum mais inclusivo, onde os países emergentes têm voz. O Brasil, por exemplo, é membro pleno do G20 e, inclusive, ocupou a presidência rotativa no ano passado. A proposta, portanto, defende um aspecto mais multilateral, com maior participação dos países em desenvolvimento nas decisões que direcionam os rumos da economia internacional”, explicou Fernanda Brandão, coordenadora do curso de Relações Internacionais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie.
Lula condena ataque de Israel ao Irã durante discurso
Ainda durante sua passagem pela cúpula do G7, o presidente Lula usou o seu discurso para citar que as guerras na Ucrânia e no Oriente Médio mostram que há um “vácuo de liderança” global. A participação não foi transmitida e o Palácio do Planalto divulgou uma transcrição da fala do petista.
Lula também criticou novamente Israel pelo que chamou de “matança indiscriminada de milhares de mulheres e crianças” na Faixa de Gaza e citou possíveis impactos do conflito recente entre Israel e Irã.
“Os recentes ataques de Israel ao Irã ameaçam fazer do Oriente Médio um único campo de batalha, com consequências globais inestimáveis”, afirmou.
O posicionamento de Lula em relação ao conflito no Oriente Médio vai na contramão do discurso empregado pelos países do G7. Na segunda-feira (16), os líderes do grupo divulgaram declaração de apoio a Israel e conderam a ameaça do Irã, considerado no documento uma “fonte de instabilidade e terror” na região.
“Os países do G7 têm mostrado interesse em promover uma resolução para evitar a escalada da guerra. No entanto, eles reforçaram o direito de Israel de se defender frente à ameaça iraniana, dado que o regime dos Aiatolás defende o extermínio de Israel e há o temor israelense de que o Irã desenvolva uma bomba nuclear”, explicou a professora Fernanda Brandão.
Além do posicionamento contrário aos líderes do G7, os movimentos da diplomacia brasileira em relação ao conflito no Oriente Médio provocaram reações entre parlamentares da oposição aqui no Brasil. Presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara, o deputado Filipe Barros (PL-PR) informou que a próxima reunião do colegiado irá aprovar uma Moção de Solidariedade a Israel.
“Em todo o Oriente Médio e mundo árabe, apenas um Estado não aceita a existência de Israel, o Irã. Direta e indiretamente, o Irã atua para, como dizem publicamente seus dirigentes políticos e religiosos, “varrer Israel do mapa”. Portanto, as ações de Israel são plenamente justificadas”, explicou.
Segundo o texto do Palácio do Planalto sobre o discurso de Lula, o petista voltou a afirmar que, pela via militar, Ucrânia e Rússia não atingirão seus objetivos na guerra que se arrasta há mais de três anos
Lula ainda citou a crise no Haiti, com dificuldades para lidar com gangues, para citar a necessidade de fortalecer a ONU – o presidente cobra uma reforma no Conselho de Segurança.