STF julga possibilidade de candidaturas avulsas nas eleições

O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a discutir nesta sexta-feira (30) se novas lideranças políticas poderão concorrer a eleições para cargos nos poderes Executivo e Legislativo sem estarem vinculadas a partidos políticos. Hoje isso não é permitido pela legislação. A norma já atrasou candidaturas e exigiu muito esforço de articulação de figuras conhecidas, como o empresário Pablo Marçal, a ministra Marina Silva e o ex-presidente Jair Bolsonaro.

A aceitação das chamadas candidaturas avulsas é relativamente comum no exterior. Ela pode beneficiar especialmente novas lideranças que almejam concorrer ao Legislativo, mas acabam impedidas por falta de acordo com as lideranças partidárias.

O autor da ação que provocou o julgamento no STF é o advogado e político Rodrigo Mezzomo que queria ter concorrido ao cargo de prefeito do Rio de Janeiro, em 2016, de forma independente. Ele afirma que a norma eleitoral brasileira deve ser interpretada segundo a Convenção de Direitos Humanos de San José da Costa Rica, um tratado internacional assinado pelo Brasil.

Mezzomo argumenta que o tratado não prevê a exigência de filiação partidária ao estabelecer como direito dos cidadãos votarem e serem eleitos “em eleições periódicas autênticas, realizadas por sufrágio universal e igual e por voto secreto que garanta a livre expressão da vontade dos eleitores”. 

Defensores das candidaturas avulsas afirmam que a sua viabilização vai reduzir o monopólio partidário, além de possibilitar o surgimento de novas lideranças políticas, fora da lógica dos partidos tradicionais. Neste contexto, figuras como o desembargador Sebastião Coelho, que pleiteia uma vaga ao Senado em 2026, poderia lançar sua candidatura sem precisar ser abrigado por um partido. Diante da regra atual, ele escolheu se filiar ao Novo.

O Ranking dos Políticos, action tank que atua em favor da pauta, afirma que essas candidaturas vão permitir a verdadeira renovação na política, abrir espaço a lideranças da sociedade civil e dar voz a causas hoje ignoradas pelos partidos. “É essencial para quebrar o monopólio dos caciques partidários, aproximar representantes das reais necessidades da população e fortalecer o exercício da cidadania”, afirmou a entidade em nota.

Para deputados como Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PL-SP), relator de uma proposta sobre o tema que tramita na Câmara, e Ricardo Salles (Novo-SP), as candidaturas avulsas são uma boa opção para o Brasil. “É uma alternativa real frente a um sistema partidário estatizado. O direito de ser eleito é fundamental, não cabe a partidos decidir quem pode ou não se candidatar”, defendeu Orleans e Bragança.

Para os críticos, as candidaturas avulsas dificultam a governabilidade e articulações no Legislativo, além de potencialmente aumentar personalismos, com candidatos representando apenas interesses próprios.

O cientista político Paulo Kramer, da Consultoria Kramer, aponta que periodicamente, pelo menos desde os anos 1930, essa questão ressurge no debate político. “A justificativa é contornar o problema colocado pela oligarquização interna e pela falta de representatividade dos partidos”, afirma Kramer.

Ele aponta ainda que a viabilização de candidaturas avulsas pode piorar a situação no Brasil. “Livres dos partidos, esses políticos não vão representar ninguém além de si mesmos”, opinou Kramer.

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PGR se manifestou contra candidaturas avulsas

Em 14 de maio, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, emitiu parecer em que recomenda que o recurso seja rejeitado. Defendeu ainda que proibir candidaturas avulsas é válido, proporcional e não fere direitos fundamentais.

O parecer de Gonet citou como exemplo um caso do México julgado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos, que decidiu que tanto sistemas com candidaturas só por partidos quanto os que aceitam independentes são compatíveis com o Pacto de San José. Assim, a PGR não considera ilegal exigir filiação partidária para disputar eleições.

Nas ações no STF, o parecer da PGR é uma opinião técnica e jurídica que orienta os ministros em decisões importantes.

O julgamento da ação estava pautado para iniciar em 16 de maio, mas a votação foi remarcada para sexta-feira (30). Os votos dos ministros poderão ser apresentados até o dia 6 de junho, quando a votação será encerrada.

No julgamento, que será realizado em plenário virtual, os 11 ministros depositarão seus votos sobre o tema no sistema do STF e não haverá debates entre eles. O relator do tema é o presidente da Corte, ministro Luís Roberto Barroso.

O julgamento também tem repercussão geral reconhecida, o que significa que a decisão tomada deverá ser aplicada de maneira semelhante por todas as instâncias da Justiça após a conclusão do caso específico em discussão.

Ao tratar do tema, ainda em 2017, quando a ação passou a tramitar no Supremo, Barroso observou que, na interpretação dada à Constituição de 1988, prevalece o entendimento de que a filiação partidária é condição de elegibilidade e, por consequência, são vedadas as candidaturas avulsas. No entanto, segundo ele, é importante que o STF discuta se a interpretação dessa norma constitucional contraria o Pacto de San José da Costa Rica, que não prevê a exigência de filiação partidária.

Sebastião Coelho, Ricardo Salles e Marco Antônio Costa: as novas lideranças que tiveram dificuldades com partidos

O deputado Ricardo Salles foi um exemplo recente de liderança política que teva a candidatura tolhida por dependências de um partido político. Ele almejava concorrer ao cargo de prefeito de São Paulo pelo seu antigo partido, o PL. O partido, no entanto, resolveu apoiar a candidatura à reeleição do prefeito Ricardo Nunes (MDB).

A decisão da legenda fez com que Salles não pudesse concorrer e mudasse de partido para tentar garantir, inclusive, a possibilidade de concorrer ao cargo de senador nas eleições de 2026. Se as candidaturas avulsas fossem permitidas, ele poderia, na época, ter concorrido a prefeito de forma independente.

O desembargador aposentado Sebastião Coelho, que despontou como referência da oposição ao criticar alegados abusos de poder do ministro do STF Alexandre de Moraes, é outro exemplo de liderança que poderia lançar candidatura ao Senado em 2026 sem precisar ser abrigado por um partido. Ele acabou negociando e sendo acolhido pelo Partido Novo.

O paulista Marco Antônio Costa, conhecido como “Superman”, também quer concorrer ao Senado e vem encontrando resistências dentro de seu partido, o PL, mesmo com suposto aval de Bolsonaro. Ele se mudou para Minas Gerais e vem tentando dialogar com diretório mineiro do PL, que não tem dado todo apoio à sua candidatura.

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Candidaturas avulsas poderiam ter facilitado negociações para Bolsonaro, Marina e Marçal

As candidaturas avulsas já foram possíveis no Brasil. Durante o Império e na Primeira República, não havia obrigatoriedade de filiação partidária para disputar cargos eletivos. A partir da Constituição de 1934, no entanto, passou-se a exigir a filiação a associações políticas para disputar eleições, como forma de institucionalizar a política.

Durante o Regime Militar, as candidaturas avulsas também eram formalmente proibidas e só era possível disputar eleições pelos partidos oficiais. Depois, a Constituição de 1988 manteve a exigência de filiação partidária para todos os cargos eletivos, como forma de organizar a representação política e o funcionamento do sistema democrático.

Com a possibilidade de candidaturas avulsas, políticos deixam de precisar do aval de partidos para concorrer aos cargos que almejam. O autor da ação em discussão no STF, Rodrigo Mezzomo, por exemplo, poderia ter concorrido ao cargo de prefeito do Rio de Janeiro em 2016.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e a atual ministra Marina Silva também já poderiam ter se beneficiado com a candidatura avulsa. Bolsonaro enfrentou uma série de trocas de partido até chegar ao antigo PSL, onde conseguiu aval para concorrer à presidência da República em 2018. Se não houvesse a necessidade de estar filiado a um partido, Bolsonaro poderia ter concorrido com uma candidatura avulsa.

Marina Silva, por sua vez, se filiou ao PSB em outubro de 2013 depois que seu partido, a Rede Sustentabilidade, não conseguiu registro no Tribunal Superior Eleitoral para disputar as eleições de 2014. Naquele ano, Marina Silva foi, a princípio, vice na chapa encabeçada por Eduardo Campos (PSB). Ela só passou a ser candidata a presidente, como desejava, depois que Campos faleceu em um acidente de avião pouco antes do início da campanha.

Outro exemplo é o caso do empresário Pablo Marçal (PRTB), que teve a sua candidatura à presidência, em 2022, barrada pelo seu partido na época, o Pros. Depois do episódio, Marçal se filiou ao PRTB, que permitiu que ele concorresse ao cargo de prefeito de São Paulo, em 2024, e deve bancar uma nova candidatura à presidência em 2026.

O que dizem a legislação do Brasil e os tratados internacionais sobre as candidaturas avulsas ou independentes 

A discussão sobre candidaturas avulsas no Brasil coloca frente a frente a legislação nacional e os compromissos internacionais assumidos pelo país. Atualmente, a Constituição Federal e o Código Eleitoral determinam que todos os candidatos às eleições devem estar filiados a partidos políticos.  

Ao tratar dos direitos políticos, a Constituição aponta seis condições para elegibilidade, dentre elas, a necessidade de filiação partidária. Já no Código Eleitoral, a vedação é expressa. “É vedado o registro de candidatura avulsa, ainda que o requerente tenha filiação partidária”, diz o dispositivo da lei aprovada depois que o tema passou a ser tratado no STF.

Uma campanha chamada “Exija o Direito às Candidaturas Independentes!”, liderada pelo Ranking dos Políticos, foi lançada nas redes sociais no final de 2024. A campanha argumenta que atualmente mais de 90% dos países permitem que cidadãos se candidatem de forma independente. É o caso de países como os Estados Unidos, a Itália, o Canadá, a Espanha e Portugal.

Na ação que tramita no STF, o partido Novo e o Rede Sustentabilidade são as únicas agremiações que defendem as candidaturas avulsas. As legendas apontaram, em audiência sobre o tema, que essa possibilidade representa a modernização do sistema político do país.

Na avaliação do cientista político e professor do IBMEC-BH, Adriano Cerqueira, o poder das lideranças partidárias diminui com as candidaturas avulsas. “Uma das consequências institucionais é ter nomes fortes, com apelo popular, que podem se lançar de forma independente”, afirma Cerqueira.

No entanto, Cerqueira lembrou ainda que, mesmo admitindo candidaturas avulsas, os Estados Unidos têm dois partidos dominando a política: Republicanos e Democratas. “Partidos menores não conseguem fazer frente a esses dois partidos, imagina uma candidatura avulsa”, comentou o cientista político. 

Por outro lado, quem é contrário às candidaturas avulsas afirma que a medida tende a fragilizar ainda mais o sistema político, ao criar figuras políticas desvinculadas de compromissos coletivos e dificultar a governabilidade. Além disso, há o risco de dispersão de votos e de enfraquecimento do papel dos partidos, que, apesar de suas falhas, ainda funcionam como mediadores entre a sociedade e o poder público.

O cientista político Paulo Kramer aponta que o caminho seria a adoção do chamado voto distrital. “Na sistemática atual de representação proporcional, o eleitor vota em quem vê e acaba elegendo quem não vê”, avalia Kramer.

Decisão do STF pode ter efeito nas próximas eleições 

A depender do entendimento do Supremo, a decisão pode ou não ter impacto já nas eleições de 2026. Caso os ministros julguem que as candidaturas avulsas são inconstitucionais, mantem-se o atual cenário em que só é possível que pessoas se candidatem estando filiadas a partidos e tendo o aval das respectivas legendas.

No entanto, caso os ministros apontem que as candidaturas avulsas ou independentes são compatíveis com a Constituição Federal, há pelo menos três possíveis linhas a serem adotadas pela Corte. Em uma das possibilidades, o próprio STF regulamentaria como deverão funcionar essas candidaturas. Outra possibilidade é que, julgando a ação procedente, os ministros apontem que a regulação caberá ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Há ainda a possibilidade de o STF dizer que as candidaturas são possíveis, concedendo ao Congresso um prazo para que a legislação seja adequada à decisão. Os debates no Congresso, no entanto, podem não avançar a tempo das próximas eleições.

Prova disso é que há propostas sobre o tema em tramitação há quase 20 anos. A PEC 229/2008 é uma delas. A proposição ainda aguarda apreciação inicial na Câmara, sem previsão de inclusão na pauta.

Essa PEC já recebeu, inclusive, pareceres opostos sobre a sua admissibilidade. Em 2018, o hoje senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que à época era deputado federal, apresentou parecer contrário à proposta, destacando que a mesma ofendia “o princípio constitucional da representação política, que se faz necessariamente por meio dos partidos políticos, que no regime democrático carecem de fortalecimento”.

Por outro lado, já em 2024, o deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança, apontou que a PEC deveria ser admitida. 

Além disso, em 2015, em meio aos debates realizados pela Comissão Especial da Reforma Eleitoral, a proposta das candidaturas avulsas chegou a ser debatida, mas não avançou.

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